Ontem assisti o primeiro debate da reunião de 10 anos do Forum Social Mundial. Entre as participações enriquecedoras de Susan George, Paul Singer, João FelÃcio, foi a fala de David Harvey que mais me empolgou. Harvey, nos últimos tempos vem trabalhando na perspectiva de organizar uma transição anti-capitalista e foi este, dentro do tema proposto para o debate – A Conjuntura Econômica Hoje – , o foco escolhido para a sua fala.
Marco Weissheimer sintetizou muito bem a maioria dos pontos abordados por Harvey, em especial, o que no meu enterder foi o cerne de sua exposição:
Não basta, portanto, denunciar a irracionalidade do capitalismo. É importante lembrar, assinala Harvey, o que a Marx e Engels apontaram no Manifesto Comunista a respeito das profundas mudanças que o capitalismo trouxe consigo: uma nova relação com a natureza, novas tecnologias, novas relações sociais, outro sistema de produção, mudanças profundas na vida cotidiana das pessoas e novos arranjos polÃticos institucionais. “Todos esses momentos viveram um processo de co-evolução. O movimento anti-capitalista tem que lutar em todas essas dimensões e não apenas em uma delas como muitos grupos fazem hoje. O grande fracasso do comunismo foi não conseguir manter em movimento todos esses processos. Fundamentalmente, a vida diária tem que mudar, as relações sociais têm que mudarâ€, defende. [ler na Ãntegra o artigo na Agência Carta Maior]
O que eu acrescentaria é que Harvey abordou o tema proposto de forma dialética, a partir da totalidade. Totalidade, como um todo concreto e relacional, constituÃdo por múltiplas determinações e mediações históricas, na qual as contradições são o movimento que desenvolve a possibilidade de uma transição anti-capitalista dentro da atual conjuntura econômica mundial. Uma aula de método dialético e de marxismo.
Essencial a sua afirmação de que é inevitável chegarmos a um ponto de inflexão na história do capitalismo, sem determinismos lineares, mas considerando a contradição entre os limites de possibilidade de expansão e a necessidade sistêmica da manutenção do crescimento. São estas oscilações quantitativas que determinam as mudanças qualitativas.
Harvey propõe uma teoria da transição que considera dialéticamente 7 momentos, fundamentados na análise de Marx sobre a transição do feudalismo para o capitalismo:
1 – as formas tecnológicas e organizacionais de produção, troca e consumo.
2 – a relação com a natureza
3 – as relações sociais entre as pessoas
4 – visões de mundo (ou concepções mentais do mundo) envolvendo o conhecimento, cultura e crenças.
5 – o processo de trabalho e produção de bens especÃficos, de serviços, de influências.
6 – os arranjos legais, intitucionais e governamentais.
7 – a direção da vida cotidiana que sustenta reprodução social.
A mudança será efetiva se for conjunta em todas estas frentes, que são relacionadas. Eu acrescentaria, me valendo de Mészaros (O poder da ideologia), que é necessário assegurar continuidade na mudança e mudança na continuidade, além de pensar o imediato, como imediato estratégico, como transformação que não possa ser tomada ou revertida.
Assim, é importante que o FSM não seja um evento auto-contido no seu espaço tempo de realização, que seja avaliado constantemente, pela ressignificação de suas finalidades e objetivos. Eu penso que um outro mundo é possÃvel, mas estou consciente de que o caminho é importante e que o rumo deve ser continuamente conferido.